Contraceção das mulheres portuguesas: tendências, anseios, desafios e escolhas

É com um misto de orgulho, mas também de alguma inquietação que vos venho falar sobre os resultados do NEST-C, um estudo sobre “Novidades Epidemiológicas Sobre Tendências em Contraceção das mulheres portuguesas”, que teve por objetivo fazer uma avaliação atualizada da nossa realidade, conhecer com maior profundidade a nossa prática e, mais do que isso, as perceções das utilizadoras e dos ginecologistas nacionais sobre contraceção.

Conduzido com o apoio científico da Sociedade Portuguesa da Contracepção, este estudo vem mostrar-nos, não apenas os números frios e estatísticas, mas também os anseios, receios e escolhas das mulheres quando se trata de proteger a sua saúde reprodutiva. Olhando para os números – que estão disponíveis na íntegra aqui -, é evidente que a contraceção oral continua a ser a escolha predominante entre as mulheres portuguesas. No entanto, o que mais valorizo não são os dados brutos, mas sim as histórias por trás deles – as histórias de mulheres que confiam em nós, profissionais de saúde, para fornecer orientação e cuidado num dos aspetos mais íntimos das suas vidas.

A contraceção não é apenas sobre prevenir a gravidez, mas também sobre capacitar as mulheres a tomarem decisões informadas sobre a sua saúde reprodutiva e o seu futuro.

Embora tenha havido avanços significativos na acessibilidade aos métodos contracetivos, especialmente em áreas urbanas, ainda existem dificuldades no acesso especialmente em regiões rurais e do interior. Barreiras financeiras, falta de informação ou informação incorreta e estigma social continuam a ser obstáculos para muitas mulheres…

Ao examinar os resultados, percebemos que os benefícios não-contracetivos das combinações hormonais combinadas (estrogénios e progesterona) mais valorizados pelos ginecologistas – controlo do ciclo e controlo da dismenorreia – são também os mais valorizados pelas mulheres, o que revela uma consonância de opiniões.

Por outro lado, o risco mais valorizado pelos ginecologistas e pelas mulheres associado aos contracetivos orais combinados foi o tromboembolismo, mas os ginecologistas não tinham essa perceção, pois atribuíram o aumento de peso como o risco mais valorizado pelas suas utentes. Esta discrepância é uma chamada de atenção para nós, profissionais de saúde, para ouvirmos atentamente as preocupações individuais de cada mulher e adaptarmos o nosso aconselhamento.

Por fim, a introdução de contracetivos “verdes”, que trazem opções mais amigáveis do meio ambiente são um passo na direção certa, como atestam os profissionais de saúde e também as mulheres inquiridas.

A utilização de estrogénios naturais, similares às hormonas humanas, resultam numa resposta hormonal mais equilibrada para o organismo. Além disso, está demonstrado que têm menor impacto no ecossistema aquático, ao contrário dos estrogénios sintéticos que têm vindo a interferir negativamente na capacidade reprodutiva dos peixes.

Neste estudo, foi possível perceber que 28% das mulheres já tinha ouvido falar do impacto ambiental dos produtos hormonais (as mais jovens estão mais informadas), com mais de

metade a admitir que irá provavelmente, ou muito provavelmente, pedir ao seu médico para prescrever uma pílula com menor efeito nos ecossistemas naturais.

Se tivesse conhecimento de uma pílula com menor impacto nos ecossistemas naturais, pediria ao seu médico para prescrever ou considerar o uso dessa pílula de para contraceção?

A contraceção verde é uma alternativa olhada como bastante positiva neste estudo, uma nova opção que oferece uma oportunidade empolgante de melhorar ainda mais as escolhas contracetivas disponíveis para as mulheres portuguesas, que podem agora beneficiar dos efeitos contracetivos e, em simultâneo, cuidar do meio ambiente.

Como médica dedicada ao cuidado das mulheres, vejo este estudo como uma chamada à ação para uma abordagem mais holística e centrada na mulher. Devemos esforçar-nos para compreender não apenas as necessidades físicas, mas também as preocupações emocionais, sociais e ambientais das mulheres que atendemos.

Em última análise, a contraceção não é apenas sobre prevenir a gravidez, mas também sobre capacitar as mulheres a tomarem decisões informadas sobre a sua saúde reprodutiva e o seu futuro. Como profissionais de saúde, é nosso dever garantir que cada mulher tenha acesso a informações precisas, opções diversas e apoio para que possa fazer escolhas que atendam às suas necessidades individuais.

É fundamental prosseguir neste caminho de melhorar ainda mais a prestação de cuidados de contraceção de qualidade a todas as portuguesas!

Dr.ª Fátima Palma

Presidente da Sociedade Portuguesa da Contracepção

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